Tocava violino, lia vorazmente, gostava da boémia lisboeta e vivia em Almada. Conhecia vagabundos, batatoteiros e loucos. A sua voz rouca, inconfundível, deu suporte a várias personagens de desenhos animados (lembram-se da Abelha Maia?). Henrique Canto e Castro (1930-2005) não tem par. Actor genial, encheu os palcos e os ecrãs de cinema com a sua técnica apuradíssima, com uma inteligência aguda e com uma enorme sensibilidade. Portugal, desgraçadamente, ignora aquele que é, porventura, o seu maior actor de sempre.
Em «Cinco dias, Cinco noites», um interessante filme de José Fonseca e Costa, Canto e Castro entra numa breve cena de cerca de cinco minutos. São cinco minutos que destroem a cena, fruto do desequilíbrio introduzido pela sua genialidade. Gestos, esgares, posições corporais, espessura psicológica – atiram a personagem a que dá corpo para patamares cinematográficos que não cabem naquela cena. A ver, a rever, a voltar a rever.